Thursday, May 22, 2008

"cadavre exquis" (cadáver esquisito)

Por outro lado, não era bem o que ela dizia, era mais a forma como se movimentava graciosamente pela sala do baile, os finos dedos que acendiam a cigarrilha e a elegância de quem não sorri, perante os olhares atentos de todos os homens sedentos de uma dança suada contra o seu peito, empalidecidos com a imagem de tocarem tão bela silhueta e nela repousarem os seus medos e ânsias. Contudo, ela não cedia e continuava a passear o seu longo vestido carmesim, serpenteando por entre casais que se amavam dançando.
E ainda que ela estivesse, noite após noite, sozinha, mais não era do que uma pantomina para os que a fitavam, decidida a nada em concreto, existia apenas na permanente adoração do momento presente.
E quando a música começava e os casais rodavam, rodavam, rodavam, ela sabia que tinha de lhe dar o seu coração. Rendida à banda que tocava, dava início à sua epifania. A noite era agora dela. E os cheiros, toques, sons, eram dela. E os movimentos, a dança e o auditório, eram dela. E aquela sala, único lugar acordado no mundo, era dela.
O êxtase de mais uma celebração monumental do seu ego.


Pedro Barbosa
Henrique Lopes

2 Comments:

Blogger fi. said...

meu deus, caiu-me tudo *.*
está lindissimo, parabens*

11:47 AM  
Anonymous Anonymous said...

simplesmente espectacular :)
é bom saber que não te perdeste (como eu) destas andanças!

5:11 PM  

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